- Cuiabá
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De Cuiabá, em Mato Grosso, até Cumaribo, cidadezinha de pouco mais de 3 mil habitantes, são 6 mil quilômetros subindo em direção a Manaus, depois Roraima, passando pela Venezuela até entrar em território colombiano, numa curva descendente e com boa parte do caminho por estrada de terra. Impensável fazer o trajeto, a menos que seja de avião. “De avião pequeno a gente leva umas oito horas”, diz o economista Guilherme Scheffer, 38 anos, um dos herdeiros da família que começou a cultivar algodão, soja e milho em Mato Grosso, nos anos 1980, e em 2015 no Maranhão, em 13,5 mil hectares de lavouras em Buriticupu, a 400 quilômetros do porto de São Luís. No total são 169 mil hectares de terras cultivadas, com produção de 562,9 mil toneladas de soja, algodão e milho na safra 2019/2020. Na atual safra, que termina em junho, a projeção vai além para uma área cultivada de 200 mil hectares ainda em processo de colheita.
Cumaribo virou rota regular para os Scheffer desde o ano passado, quando a família iniciou um projeto piloto de agricultura nessa região colombiana tomada pela pecuária e quase um deserto na geração de emprego e renda, num país com uma população de 50 milhões de pessoas. “É fazer o que a gente fez em Mato Grosso 40 anos atrás”, diz ele. “A Colômbia importa produtos, como soja e milho, que é o básico de commodities que a gente está acostumado a fazer no Brasil.”
O famoso país dos cafés especiais que ganharam o mundo no rastro do icônico símbolo de Juan Valdez e sua mula – animal reconhecido por sua capacidade de superar obstáculos no caminho – cultiva irrisórios 50 mil hectares de soja, mas é dona de grandes áreas planas com pastagens naturais e de fácil conversão para a agricultura. O desafio não é pequeno, porque a Colômbia do bom café, e de quebra com lindíssimas praias caribenhas, também luta para sair de um estado de conflitos históricos que emperram seu desenvolvimento. “Estamos começando um projeto de grande impacto econômico e social na Colômbia, com grandes desafios, mas com geração de renda e empregos”, diz Scheffer. Neste início de projeto já há 50 pessoas na operação, das quais apenas três são brasileiras.
Na primeira safra, para experimentar a área, foram plantados mil hectares de soja e mil hectares de milho. Nesta safra serão 2,5 mil hectares de soja e 4 mil de milho, em dois ciclos. Mas a meta, passado mais um ano de ajustes de tecnologias, é estender a área de cultivo arrendando terras. “Queremos uma operação que justifique estarmos em outro país. Inicialmente, a meta é 40 mil hectares, podendo chegar a 100 mil hectares na Colômbia”, afirma Guilherme.
Não fosse pela adoção da agricultura regenerativa, que está mudando radicalmente o modelo de negócio, os planos da família de origem paranaense de internacionalizar suas operações seriam apenas mais um caso de investimento na América Latina, como já ocorre com uma leva de produtores, cooperativas e agroindústrias brasileiras instaladas na Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile. Com 1.800 funcionários, cultivo de 225 mil hectares juntando as duas safras de uma mesma área e receita de R$ 1,55 bilhão no ano passado – valor 55% acima de 2019 e previsão de R$ 1,77 bilhão em 2021 –, a Scheffer quer ser referência em agricultura regenerativa, levando o modelo para o centro estratégico do crescimento da empresa. Há ainda no negócio 27 mil hectares de terras para a pecuária, com abate de 25 mil bovinos em sistema semiconfinado, por ano, e 140 mil hectares de terras preservadas como reserva e áreas de proteção permanente.
Apostar na agricultura regenerativa no Brasil e na Colômbia, uma mudança radical de patamar tecnológico que prega menos uso de agroquímicos, uma visão geral no trato das plantas e o cuidado máximo no manejo do solo, equipara-se à aventura inicial do patriarca, Eliseu Maggi Scheffer, hoje com 64 anos e ainda na operação: colocar a família a bordo de uma caminhonete em Rondonópolis e desembarcar 700 quilômetros depois, em Sapezal, no norte de Mato Grosso, em meados dos anos 1990, sem ser dono de um único palmo de terra. “Não tinha dinheiro para comprar terras. No começo, a gente dormia numa oficina, em um barraco atrás de um posto de gasolina. Meu pai trabalhava muito para dar certo”, lembra Guilherme. O pai, que é sobrinho de André Maggi, fundador do império Amaggi, um dos maiores grupos agropecuários do Brasil, arrendou do tio 900 hectares.
Ainda sem terras, que começaram a ser compradas somente no final dos anos 1990, Eliseu chegou a cultivar 27 mil hectares arrendados. Ele foi o primeiro produtor de algodão de Sapezal, numa área de 150 hectares que necessitou de 300 pessoas para socar no pé, por falta de máquinas prensadoras, os fardos que seriam embarcados para a algodoeira mais próxima, a 200 quilômetros. Hoje, a Scheffer cultiva 60 mil hectares da fibra, é dona de cinco algodoeiras e fez do município de Sapezal o maior produtor de algodão do Brasil, com índices entre 10% e quase 15% da produção nacional das últimas safras.
Fonte: Odocumento